A repetição da história
Luis Nassif
Luis Nassif
São significativas as semelhanças entre os tempos atuais e o período
pré-64, que levou à queda de Jango e ao início do regime militar e mesmo
o período 1954, que levou ao suicídio de Getúlio Vargas.
Os tempos são outros, é verdade, e há pelo menos duas diferenças
fundamentais descartando a possibilidade de um mesmo desfecho: uma
economia sob controle e uma presidência exercida na sua plenitude, sem
vácuo de poder.
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Tirando essas diferenças, a dança é a mesma.
A falta de perspectivas da oposição em assumir o poder, ou em
desenvolver um discurso propositivo, leva-a a explorar caminhos
não-eleitorais.
Parte-se, então, para duas estratégias de desestabilização – ambas em pacto com a chamada grande mídia.
Uma, a demonização dos personagens políticos. Antes do seu suicídio,
Vargas foi submetido a uma campanha implacável, inclusive com ataques à
sua honra pessoal – que, depois, revelaram-se falsos.
No quadro atual, sem espaço para criticar a presidente Dilma Rousseff, a
mídia – especialmente a revista Veja – move uma campanha implacável
contra Lula. Chegou ao cúmulo de ameaçar com uma entrevista
supostamente gravada (e não divulgada) de Marcos Valério, como se
Valério tivesse qualquer credibilidade.
Surpreendente foi a participação de FHC, em artigo no Estadão,
sustentando que o julgamento do “mensalão” marca uma nova era na
política. Até agora, o único caso documentado de compra de votos foi no
episódio da votação da emenda da reeleição – que beneficiou o próprio
FHC.
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A segunda estratégia tem sido a de levantar o fantasma da guerra fria.
Mesmo sabendo que Jango jamais foi comunista (aliás, o personagem que
mais admirava era o presidente norte-americano John Kennedy) durante
meses e meses levantou-se o “perigo vermelho” como ameaça.
Grande intelectual, oposicionista, membro da banda de música da UDN, em
1963 Afonso Arino escreveu um artigo descrevendo o momento. Nele,
mencionava o anacronismo de (em 1963!) se falar de guerra fria, logo
depois de Kennedy e Kruschev terem apertado as mãos. E dizia que, mesmo
sendo anacronismo, esse tipo de campanha acabaria levando à queda do
governo pelo meio militar, devido à falta de pulso de Jango, na condução
do governo.
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O modelo de atuação da velha mídia é o mesmo de 1964, com a diferença de que hoje em dia não há vácuo de poder, como com Jango.
Primeiro, buscam-se personalidades, pessoas que detenham algum ativo
público (como jornalistas, intelectuais, artistas etc.). Depois, abre-se
a demanda por comentaristas ferozes. Para se habilitar à visibilidade
ofertada, os candidatos precisam se superar na ferocidade dos ataques.
Poetas esquecidos, críticos de música, acadêmicos atrás de visibilidade,
jornalistas, empenham-se em uma batalha similar às arenas romanas, onde
a vitória não será do mais analítico, ponderado, sábio, mas do que
souber melhor agredir o inimigo. É a grande noite do cachorro louco, uma
selvageria sem paralelo nas últimas duas décadas.
Com sua postura de não se restringir ao julgamento do “mensalão” em si,
mas permitir provocações à presidente da República e a partidos, o STF
não cumpre seu papel.
Aliás, o STF do pós-golpe foi muito mais democrático do que o atual Supremo.
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