Adriano
Benayon* -
13.08.2012
Texto enviado pelo
autor
1. Os
principais jornais, revistas e TVs, sempre alinhados com os interesses
imperiais, dão grande destaque ao julgamento, no Supremo Tribunal Federal, do
mensalão, levado adiante nas instâncias do Estado, porque atinge principalmente
José Dirceu, um líder centralizador de poder, e tido por ser de esquerda. Além
disso, pode abalar a popularidade de Lula
2. Em todo o
mundo, os oligarcas estrangeiros e seus agentes e laranjas locais tratam de
minar quaisquer lideranças que aspirem a voos próprios e se tornem, assim, menos
dependentes dos dinheiros daqueles.
3. O sistema de
poder mundial trata de fazer alternar no Executivo partidos que cumpram suas
determinações. No Brasil, conquanto tenha como agentes preferenciais o PSDB e
aliados, a oligarquia anglo-americana - para dar espaço a Lula – se valera, em
1994, das fraudes que alijaram Brizola do segundo turno.
4. E ela não
fez virar a mesa, quando, em 2002, Lula derrotou o candidato de FHC,
desgastadíssimo pelos efeitos sobre a população dos desastres causados pelo
governo do PSDB. Lula foi logo anunciando nomeações de agentes da oligarquia,
como Meirelles para presidir o Banco Centra,l e Marina Silva, ministra do
Meio-Ambiente.
5. Por outro
lado, embora o PSDB não seja palatável para a maioria dos eleitores, a
oligarquia conta com o tempo decorrido desde 2002 e com a amnésia ministrada
pela grande mídia para fazer esquecer a devastação tucana.
6. E, para
ajudar nisso, nada melhor que expor a responsabilidade do PT num grande esquema
de corrupção, não porque o PT não esteja atendendo os interesses do poder
mundial, mas porque os concentradores preferem manter viva sua alternativa mais
segura, o PSDB.
7. Ademais, a
corrupção está entre os temas que têm suscitado maior preocupação ao povo
brasileiro, e não apenas no seio da classe média, tradicionalmente
moralista.
8. Alguns blogs
independentes ou patrocinados pelo atual governo lembraram que os tucanos
cometeram, nos oito anos de FHC, atos de corrupção causadores de danos muito
mais profundos para o País, e nisso esses blogs têm razão.
9. Falta,
porém, razão aos que negam o mensalão. Mais relevante que isso: deixam de
observar que a corrupção do mensalão comprou parlamentares de partidos menores,
não para aprovar propostas favoráveis à sociedade brasileira, mas para aprovar
emendas constitucionais e leis que deram continuidade à agenda do império, a do
Consenso de Washington e do FMI.
10. Isso parece
até contraditório, já que, para esse tipo de coisa, o PT poderia ter o apoio da
“oposição”, PSDB, DEM, PPS e outros, fieis à agenda entreguista, embora houvesse
a possibilidade de se oporem, como fez o PT, no período FHC, sabendo que ela
seria adotada de qualquer modo.
11. Mais que
isso: o PT julgou necessário garantir maioria estável no Congresso, ameaçada
pela flutuação dos votos de grande parte dos parlamentares do PMDB e de outros
partidos cujo apoio depende de cargos e vantagens.
12. De qualquer
forma, o mensalão não passa de um caso da corrupção de varejo. Mas esse teve
grande repercussão, ao contrário do mensalão tucano em Minas Gerais e da ainda
mais grave compra de deputados para votarem a favor da emenda constitucional que
permitiu a reeleição de FHC.
13. E que dizer
dos casos de mega-corrupção tucana com as privatizações, evasão de divisas no
escândalo do BANESTADO etc.?
14. O que o
povo brasileiro precisa saber, para agir em consequência, é que a corrupção no
País é sistêmica.Que quer dizer isso? Que ela decorre da estrutura econômica,
social e política existente.
15. E o que
caracteriza essa estrutura? A concentração da propriedade dos meios de produção
em mãos de grupos econômicos, hoje, basicamente estrangeiros ou
desnacionalizados.
16. Provém
desses grupos a corrupção ativa, os abusos do poder sobre o mercado, as fraudes
em prejuízo dos consumidores e outras formas de corrupção. Corrompem não só
políticos e agentes públicos, mas gente do setor privado dentro desses próprios
grupos e em outras empresas.
17. Tudo isso
resulta no empobrecimento da grande maioria dos brasileiros, apesar de o País
ser extremamente rico em terras férteis, água, minérios preciosos e
estratégicos.
18. Passa, em
geral, despercebido que a corrupção no setor público parte, amiúde, do setor
privado. Concorre para essa falta de percepção a atitude seletiva da grande
mídia, a qual enfatiza a corrupção no âmbito do Estado. Embora aponte também
casos com empresários no pólo ativo da corrupção, trata de acobertar grandes
transnacionais e bancos.
19. O aspecto
social da estrutura econômica mostra-se na concentração da renda, com 60% da
população sem renda ou ganhando menos de dois salários mínimos. O quadro é tão
deplorável, que os “especialistas” da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE)
da Presidência da República definem como de classe média as famílias com renda,
por pessoa, entre R$ 291 e R$ 1.019 mensais.
20. Do outro lado, são colossais os
ganhos das transnacionais e dos bancos, que comandam a economia e a política. As
transferências das transnacionais ao exterior descapitalizam o País de forma
aguda, inviabilizando que os ganhos do mercado sejam reinvestidos na economia
produtiva.
21. Até mesmo
os brasileiros ricos, que têm muito menos poder e incluem servidores oficiais e
extra-oficiais dos concentradores, já detinham, no final de 2010, recursos
financeiros em paraísos fiscais no exterior de US$ 520
bilhões.
22. Claro está
que os partidos políticos e os resultados das eleições são controlados pelos
grupos concentradores, os quais determinam, ademais, o acesso das pessoas aos
meios de comunicação e o que, através destes, se “informa” e desinforma aos
cidadãos.
23. É de
concluir, pois, que a estrutura política é incompatível com o Estado democrático
de direito e decorre da estrutura econômica concentrada e desnacionalizada.
24. As normas
democráticas da Constituição permaneceram letra morta, como a que limita os
juros reais a 12% aa., enquanto as favoráveis aos concentradores são
rigorosamente aplicadas e foram acrescidas das reformas de FHC, instituídas
conforme as receitas do Consenso de Washington, FMI e Banco Mundial e mantidas e
prorrogadas nos governos petistas.
25. Deveria também ser conhecido de
todos que a Constituição de 1988 foi fraudada para privilegiar o “serviço da
dívida” no Orçamento Federal e realizar descomunal sangria, que já passa de R$ 7
trilhões, esvaziando do País os seus recursos.
26. Ninguém,
entre os constituintes, reparou na fraude. Será? Se alguém notou, fingiu que não
notou. Nem o relator nem o presidente da Assembléia Constituinte, nem seus
assessores, nem líder de partido algum.
27. O
estelionato foi cometido através de requerimento de fusão de emendas de redação
aos atuais artigos 165/167, inserindo no 166 o dispositivo fraudulentamente
acrescentado ao texto aprovado no primeiro turno, ao submetê-lo para aprovação
em segundo turno.
28. Na página
do requerimento em que o texto foi adulterado, está a rubrica de Nelson Jobim,
agora nomeado por Sarney, presidente do Senado, para liderar o grupo de
“notáveis” que elabora revisão do pacto federativo. Constituição cidadã? Não,
demagogia!
29. A
concentração e a
desnacionalização da economia intensificaram-se desde 1954, e, desde 1988, esse
processo acelerou-se. Daí vem a inviabilidade de ser praticado no País qualquer
sistema de governo democrático.
30. Está
arraigada, nas universidades e nos demais meios de comunicação social a falsa
ideia de que pluralismo de partidos, “liberdade” de imprensa e de informação e
eleições periódicas são suficientes para caracterizar a democracia.
31. Que essas
condições não garantem democracia alguma está sendo mais percebido nos países
“desenvolvidos” abalados pelo colapso financeiro e pela depressão (recessão é
eufemismo, mal fundamentado através da manipulação de dados
estatísticos).
32. Naquelas
“democracias”, como no Brasil, os partidos e as eleições são controlados pelos
concentradores financeiros “privados”, os grandes bancos e transnacionais, que
são de propriedade privada, mas exercem poder público.
33. Isso está
na raiz dos colapsos econômicos e não só impediu de moderar a natural tendência
à concentração do sistema capitalista, mas a agravou através da legislação e da
política econômica.
34. Desde a
crise de 2007, os concentradores privados ganharam recursos e vantagens
governamentais da ordem de US$ 30 trilhões, enquanto as condições sociais se
agravavam.
35. Portanto, é
a oligarquia financeira que origina a corrupção sistêmica e dela se beneficia.
Ademais as “formas democráticas” não evitaram sequer que fosse instituído nos
EUA o Estado policial, principalmente a partir do golpe de 11 setembro de 2001.
36. Só os menos
informados ignoram ter havido, nesse dia, um golpe da oligarquia para facilitar
novas guerras e agressões imperiais e eliminar as garantias constitucionais, a
pretexto de combater um terrorismo inexistente ou facilmente contível.
37.
A “democracia” brasileira é calcada nesses modelos nada
exemplares, e a iniquidade social é maior que nos países “desenvolvidos”. E,
como se isso tudo não bastasse há, ainda, a urna eletrônica sem a possibilidade
de conferir o voto.
38. Mas como
erguer um sistema realmente democrático, com maior espaço para a democracia direta
e capaz de assegurar que a democracia representativa não mais seja a farsa que
tem sido?
39. Como
instituir sistema democrático sem transformação profunda na estrutura econômica
e social? Ou será que teríamos de, antes, transformar as instituições políticas
subordinadas aos concentradores da estrutura econômica?
42. Que fazer,
então, diante do fato de que não há como sequer modificar superficialmente essas
instituições enquanto elas estiverem de pé?
Adriano
Benayon* é doutor em economia e autor
do livro Globalização versus Desenvolvimento, Editora Escrituras,
SP.
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