segunda-feira, 9 de maio de 2016

Nunca é tarde para abrir os olhos

Em 1997, quando a reeleição de Fernando Henrique foi comprada no Congresso, eu estava muito ocupado jogando Nintendo 64. Devo ter passado uns dois anos na última fase de 007 Contra GoldenEye. Estouraram uma dúzia de escândalos, mas meus amigos e eu estávamos obcecados em grudar bombas nas paredes de um bunker soviético.

Quando Lula, já eleito, se aliou à bancada evangélica e ao agronegócio para garantir a tal governabilidade, eu estava muito ocupado tentando transar. Lula não fez reforma agrária, mas eu tampouco estava transando –e isso era muito mais preocupante para mim.

Quando Eduardo Paes ganhou eleições trucadas contra Gabeira, eu estava muito ocupado tentando aprender a dançar forró –em vão. O preço da passagem de ônibus aumentava todo mês, mas eu ia pro ballroom de bike. Não fazia diferença.

Passei minha escolaridade à margem das questões políticas –embora motivos para a revolta não faltassem. Vi, de canto de olho, o país ser pilhado, as favelas serem militarizadas, vi assédios, vi chacinas –era tudo estranho, mas natural. Sempre foi assim, diziam, e sempre vai ser. Acreditei.

Tomei um susto quando vi a primeira ocupação dos estudantes –uma mistura de fascínio com culpa por não ter feito isso na minha adolescência. Talvez seja por isso que me emociono quando vejo estudantes tomando as ruas, ocupando a Alesp, talvez seja por isso que choro quando vejo a menina Carol botando o dedo na cara do Coronel Telhada. Era isso que a geração dos meus pais tentou fazer e foi silenciada. Era isso que a minha geração nem sequer tentou fazer porque achou que não faria diferença. É claro que os estudantes de hoje também estão ocupados com videogame, sexo e forró –não necessariamente nessa ordem. Mas perceberam que nada disso é incompatível com a luta política. Muito pelo contrário.

Caro Alckmin, você viveu uma ditadura militar sangrenta. Vereador pelo MDB, você poderia ter feito alguma diferença. No entanto, enquanto presos morriam torturados nos porões da ditadura, você estava ocupado escrevendo uma carta ao Médici em que rasgava elogios ao presidente, destacando sua "sensibilidade às questões sociais".

Espero que, hoje, o senhor tenha se informado um pouco mais sobre o regime que admirava. Nunca é tarde para abrir os olhos. Caso queira aprender, os estudantes têm muito a ensinar. Aposto que eles vão te receber de braços abertos. Mas leva comida que eles estão sem merenda.

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