"Temos que voltar a ter estoques. Numa situação de preços já voláteis, havendo crise, seca, guerra e tendo que se comprar grandes quantidades de alimentos, o preço vai ainda mais para cima". A afirmação do diretor eleito da FAO, José Graziano da Silva, feita na entrevista coletiva realizada em Roma, na 2º feira, é um primeiro sinal de mudança substantiva na estratégia do organismo, que o brasileiro passa a dirigir a partir de janeiro de 2012. Nas últimas décadas, a supremacia neoliberal colonizou boa parte da agenda das agencias e organismos internacionais. A terceirização das políticas de desenvolvimento aos ditos 'livres mercados' contaminou a esfera da segurança alimentar. Nações, sobretudo as mais pobres, e organismos multilaterais foram incentivadas a renunciar aos cuidados com a soberania alimentar. A ordem era transferir aos livres mercados --mais eficientes e ágeis, dizia-se-- a incumbência pelo suprimento da sociedade. Se o mercado mundial é capaz de prover a demanda de forma ágil e a preços mais competitivos, por que então carregar estoques estratégicos de custos onerosos e, sobretudo, qual o sentido de incentivar a produção agrícola local em busca de uma autosuficiência alimentar difícil e custosa aos cofres públicos? A crise financeira desencadeada a partir do 2º semestre de 2007, e a fulminante especulação com aos preços das commodities agrícolas a a partir de então, respondeu a essas dúvidas cobrando um custo alto em colapso alimentar e fome em muitos países. No ápice da escassez e da fome as nações e organismos como a FAO estavam desarmados para suprir a demanda. Onde estavam os estoques? Onde continuam a repousar: em celeiros privados das grandes corporações que dominam o comércio e a produção mundial de alimentos e que fazem questão de manter em sigilo o volume dessas reservas. Para não prejudicar suas apostas nos mercados especulativos. A mudança de orientação sinalizada agora por Graziano desautoriza o conservadorismo midiático que, desgostoso com a vitória brasileira na FAO, tratou em seguida de minimizar a sua importância. Nas perorações sobre a suposta irrelevância da FAO esqueceram de de considerar que a história mudou e a FAO terá que mudar também. A eleição de Graziano, na realidade - apoiada pelos países pobres e em desenvolvimento que mais sofreram com a crise e o êngodo neoliberal - já foi um sintoma dessa mudança.
(Carta Maior; 5º feira, 30/06/ 2011)
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