terça-feira, 30 de dezembro de 2014

Mercado sul-americano avança para substituir o dólar

Os sul-americanos estão cada vez mais se transformando em tremendas dores de cabeça para Washington. Desta vez, na 8ª Cúpula de Governos da Unasul, em Quito, realizada na semana passada, a pauta dos governantes destacam duas bombas políticas incômodas a Tio Sam: 1. Acelerar operação do Banco do Sul; e 2. Iniciar, por meio do Banco do Sul, relações comerciais sul-americanas por moedas locais.

Por Cesar Fonseca, na Adital


Reprodução
Mercado de moedas sul-americano avança para substituir supremacia do dólar no continente Mercado de moedas sul-americano avança para substituir supremacia do dólar no continente
São 12 países que iniciam exercício nessa tarefa histórica que tende a colocar o dólar de sobreaviso como moeda equivalente universal em vigor no mundo desde Bretton Woods, em 1944.

Desde lá, tem sido a moeda americana o farol do mundo, deslocando-se a libra inglesa, predominante em todo o século 19 como força imperial.

A crise capitalista de 2007-2008 marca o estresse geral do dólar. Serviu ela como alerta geral aos povos para que se virem nos processos de cooperação, porque ficar na dependência da moeda americana pode ser caixão e vela preta.

O império, em crise, para se salvar, dobrou apostas em guerra monetária, imprimindo moeda adoidado, encharcando a circulação capitalista mundial de moeda sem lastro real. As consequências dessa ação imperial, cuja força relativa cai dia a dia na cena internacional, levaram a China e a Rússia a apressarem trocas comerciais em rublo e em yuan. Os Brics – Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul – irão nesse sentido nos próximos anos. O Banco dos Brics, cuja criação preocupa Washington, tende a ser a grande caixa de compensação financeira das moedas dos países integrantes do bloco, para dinamizar trocas comerciais ao largo do dólar.

O mesmo vai acontecer com o Banco do Sul, cujo lastro, sem dúvida, são as riquezas sul-americanos, ativos poderosos: minérios, petróleo, energia, água, terras, alimentos, ouro, das quais os países ricos dependem para dinamizar suas indústrias. Quem não aceitaria um papel sul-americano, lançado pelo Banco do Sul, lastreado em petróleo, em alimentos, em minérios, em energia sul-americanos?

A próxima etapa é transformar matérias primas sul-americanas em produtos acabados sob impulso dos discursos nacionalistas que vão ganhando dimensão extraordinária na esfera política continental, como arma de libertação econômica e financeira dos países ricos, cujas moedas perdem importância relativa. Tanto o dólar como o euro já não são determinantes para impor suas vontades.

O Banco do Sul, junto com o Banco dos Brics, serão a nova força econômica, se o sentido de união política fincar raízes fortes na condução das estratégias desenvolvimentistas em marcha na América do Sul, como forma de vencer os desafios sul-americanos, marcados, especialmente, pela desigualdade social.

O jogo político continental ganha nova dinâmica

Os discursos favoráveis à integração sul-americana abundam.

Não faltam propostas, mas decisão de levá-las adiante com determinação política.

A crise mundial está aí e a América do Sul está correndo perigo de se transformar em exportadora de matérias primas, vendo sua tênue indústria ir para o brejo no contexto da guerra monetária global em curso, desencadeada pelos países ricos.

Os Estados Unidos estão se recuperando por que, mesmo?

Porque, antes de mais nada, são nacionalistas.

Os americanos mantêm, na crise, a taxa de juro na casa dos zero ou negativa, exportando moeda desvalorizada para os outros.

O que fazem os outros?

Sem força, engolem essas moedas podres, sem lastro real, acumulando-as, em forma de reservas cambiais, sem nenhum lucro, porque não rendem nada, apenas, problemas potenciais.

A indústria americana deu uma boa respirada, o desemprego diminuiu e Washington segue tocando o Estado Industrial Militar Norte-Americano.

É a sua estratégia para tentar continuar dando as cartas, embora o dólar esteja abalado pelo excesso de oferta de moeda jogada na praça global pelo Banco Central, nos últimos três anos.

Qual a saída fora disso aí?

A Europa, mergulhada na paralisia, vai no mesmo caminho.

Joga, agora, muita moeda na circulação, com expectativa de estouros aqui e ali, porque, ao contrário dos Estados Unidos, ela não é um Estado federalizado, mas um monte de federalizações.

O BC europeu tem que coordenar muitos interesses nacionais sob a capa do euro.

É cabeça batendo cabeça.

Não está dando certo.

A Alemanha, mais forte, quer fugir do euro e restabelecer o marco alemão.

Os alemães, ricos e tecnologicamente preparados, não querem continuar bancando déficits de aliados que a Alemanha empobreceu, no processo de afirmação do euro.

A jogada alemã é ter moeda forte para importar matérias primas e exportar manufaturados.

Por isso, Ângela Merkel quer que os aliados possam desvalorizar suas moedas, serem competitivos e exportarem para a Alemanha suas mercadorias, para comprar dos alemães os manufaturados de tecnologia sofisticada, com os quais possa acumular superávit comercial.

Tanto Europa como Estados Unidos seguem a receita japonesa de mais de 20 anos: desvalorização monetária intensa e juro negativo, descontada a inflação, para tentar vencer a deflação, maior inimiga do capitalismo.

Estados Unidos, Europa e Japão, outrora as locomotivas capitalistas, porém, jogam no mesmo campo.

Os três desejam exportar, exportar, exportar, porque seus mercados internos estão relativamente reduzidos depois da crise global de 2007-2008.

A Europa se danou porque estocou muito derivativo em dólar, caindo na vala da especulação financeira como forma de gerar renda disponível para o consumo de bens e serviços.

Banco do Sul e econômica expressa

Uma beleza a nova sede da Unasul em Quito inaugurada essa semana levando o nome de Nestor Kirchner, ex-presidente argentino, um dos grandes incentivadores da união continental para a integração econômica total sul-americana.

Quando a bolha estourou, os consumidores, endividados, tiveram que optar por mais poupança do que gastança, para ir liquidando seus passivos.

O mercado consumidor estreitou-se.

Os preços, nesse contexto, desabam e a deflação se aproxima.

Para vencê-la, a ortodoxia monetarista recomendada pelo Fundo Monetário Internacional não é remédio, é veneno.

O capitalismo, comandado pelos países ricos, está desarticulado pelas suas próprias contradições, e os seus mercados estão sendo invadidos pela China, que, com a Rússia, acelera, no âmbito dos Brics, a derrocada relativa do dólar.

Adotam os russos e os chineses o comércio amparado em suas próprias moedas, criando modelo que vai minando as relações de trocas globais, pautadas, apenas, pela moeda americana, bichada pelo excesso de dívidas dos Estados Unidos etc.

Washington virou tigre de papel.

Diz que vai enxugar o excesso de moeda.

Quem pode fazer não avisa, faz.

Se faz muito barulho é porque não pode fazer, ou seja, puxar a taxa de juro, para enxugar a enxurrada de moeda que jogou no mercado, fragilizando o dólar.

Se Tio Sam puxar o juro, quem dançará é ele, que deve muito.

Teria que lançar uma espécie de real brasileiro, um dólar II, como forma de impedir avanço de inflação exponencial, que jogaria o império no chão, como aconteceu com a Alemanha nos anos 1920-1930.

Os ricos empobrecidos querem mercado, mercado, mercado, cada vez mais escasso, dada a maior oferta do que a demanda globais, impulsionadas pela tecnologia colocada a serviço da produção e da produtividade sobre um planeta geograficamente estressado pelo excesso de poluição ambiental, comprometedora da sua saúde integral etc.

Sobram para grandes explorações do capital financeiramente acumulado as oportunidades de construção de amplas infraestruturas nos continentes sul-americano, africano e asiático.

A Ásia os asiáticos cuidam dela.

Para tanto, apostaram, competentemente, na educação, na ciência e na tecnologia, para manufaturar todas as matérias primas que produzem e que adquirem dos outros.

A China fez isso mais brilhantemente importando empresas americanas com compromisso de transferir internamente tecnologia e elevar exportações.

Tomou mercado tanto na Europa como nos Estados Unidos e avança na América do Sul e África.

Porém, como as exportações caem em face do estresse capitalista global, os chineses se voltam para dentro, fazendo a política de Lula e Dilma: apostar nos salários, nos programas sociais, para aumentar a demanda interna etc.

Ou seja, todos se voltam para dentro, na crise.

Ou como disse Marx, as contradições do capitalismo em sua fase financeira aguda se dará no estresse do comércio internacional.

A Europa atua para dentro, com a Alemanha lutando para preservar o mercado europeu para ela, com a sua força, cuja preservação ela pensa que pode ser alcançada com a supressão, JÁ, do euro.

Os Estados Unidos cuidam de si, com sua política monetária e fiscal nacionalista, enquanto vai tentando desestabilizar os concorrentes, fazendo guerra, como a da Ucrânia, em que apoia fascistas no poder contra Putin.

Dilma que se cuide, porque ao aliar-se aos Brics e dar preferência aos suecos na compra dos caças para a Aeronáutica, como represália a Washington pelo episódio da espionagem, virou alvo preferencial de ataques e escaramuças gerais de Tio

E a América do Sul?

Vai ficar como criança amedrontada, boca aberta, cheia de dentes, esperando a morte chegar, como disse Raul Seixas, diante dos que querem abocanhar suas riquezas ou vai partir para valorizar seus ativos por meio do Banco do Sul, transformando-o em caixa de compensação das suas reservas cambiais e moedas locais, a fim de tocar a infraestrutura sul-americana?

Os Estados Unidos certamente temem que os sul-americanos joguem no Banco do Sul suas reservas em dólares, para reciclá-las em moedas locais, a fim de gastá-las na infraestrutura sul-americana.

Seria como se livrassem de um ativo candidato a virar boró.

Ou não?

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