quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A Arte da Guerra. No Rio de Janeiro


Luciano Rezende *

Sun Tzu disse: “Na guerra, o objetivo principal é a vitória. Se esta tardar, embotam-se as armas e deprime-se o moral”. Décadas da presença do crime organizado em vastas regiões da cidade do Rio de Janeiro, com a cumplicidade de setores da própria polícia, fizeram com que a reputação desta corporação e dos poderes constituídos do Estado fosse maculada perante o povo. Resgatar a confiança e a credibilidade das instituições de segurança pública é tarefa das mais importantes.

Sun Tzu disse: “Ataca onde quer que o inimigo esteja despreparado; irrompe quando ele não te esperar”. Como se diz: “Quando o trovão ribomba, não há tempo de tapar os ouvidos”. A complexidade do tráfico faz necessário que além das ações mais enérgicas e de enfrentamento ostensivo se invista no trabalho de inteligência. Sitiar as movimentações financeiras é uma forma de manter o inimigo sob pressão e esgotá-lo.

Sun Tzu disse: “A natureza do terreno é o fator fundamental para o exército consolidar sua vitória”. “(...) Em terreno íngreme, devo tomar posições nas elevações ensolaradas e aguardar o inimigo”. Com as instalações das Unidades de Polícia Pacificadora (UPP’s) nos topos dos morros, deslocando os traficantes de suas antigas bases estratégicas, contribuirá sobremaneira para uma efetiva ocupação destas comunidades que, por sua topografia irregular, necessita contar com visão privilegiada para dificultar o retorno do inimigo. “Quando um gato se posta diante de um buraco de ratos, dez mil ratos não saem; quando o tigre vigia o vau, dez mil carneiros não atravessam o rio”.

Sun Tzu disse: “Um exército sem agentes secretos é exatamente como um homem sem olhos e sem ouvidos”. Nesse quesito, parece que os traficantes sempre dispuseram de informações privilegiadas partindo de dentro da própria polícia. Em contrapartida, percebe-se que agora a própria população, ao readquirir o moral de combatentes auxiliares desta guerra, passa a ser informante contra o tráfico, apoiando a polícia através de importantes denúncias telefônicas.

Sun Tzu disse: “Quando as tropas estão em situação favorável, o covarde é bravo; quando não, o bravo é covarde. Na arte da guerra não existem regras fixas. Estas dependem unicamente das circunstâncias”. Esperemos que a firmeza do discurso oficial no atual momento seja mantida com o decorrer do tempo e que as políticas sociais de fato “subam o morro” e sejam implantadas com a coragem necessária para superar de vez as práticas assistencialistas do inimigo.

Sun Tzu disse: “Não permitas que seus inimigos se aliem. Examina o conteúdo dessas alianças e provoca sua ruptura. Se o inimigo tem alianças, o problema é grave e a posição dele, muito forte; se não as tem, o problema é menor e a posição dele, muito fraca”. O crime organizado no Rio conseguiu tecer vasta rede de colaboradores. Tem representação no Parlamento e está infiltrado em várias repartições com anuência de vários agentes do poder público. Romper esse consórcio é tarefa a ser perseguida.

Sun Tzu disse muito mais em “A Arte da Guerra”. Documento milenar que a despeito de seu contexto histórico guarda enorme atualidade. Mas Sun Tzu não viveu o capitalismo. Não desconfiava de poder existir um modo de produção capaz de disseminar uma cultura de guerra e violência de fazer inveja aos antigos senhores de guerra.

A cultura da violência vem do berço no capitalismo que sobrevive do espírito de uma bestial competição, em todos os sentidos. A própria insegurança da população é um ótimo negócio a ser comercializado pela indústria da segurança, inclusive por milícias. Banalizou-se a violência como em poucos momentos da história da civilização. Hoje uma criança pede à mãe para comprar um “caveirão” do Bope de brinquedo, assistindo um ingênuo Pica-pau vermelho e azul meter uma paulada na cabeça de um índio. Todos riem.

Relembrando Brecht: “Muitos acusam o rio de violento, mas poucos são os que condenam as margens que o reprime”. Em meio a mais uma cobertura midiática sensacionalista, é fundamental que, ao reafirmarmos a validade das operações policiais, também sejamos capazes de fazer uma leitura histórica e científica da violência no Rio, no Brasil e no mundo. Não ser ingênuo a ponto de pensar que o tráfico vai ser vencido apenas com políticas sociais, mas também não imaginar que somente a ação policialesca será suficiente para se alcançar o apaziguamento. O rio (e o Rio) está (ão) cada vez mais estreito (s).

A verdadeira paz só será atingida com outro sistema social, o que exigirá um outro tipo de guerra, mais prolongada, de longo fôlego. Sun Tzu disse: “A invencibilidade depende de nós. A vulnerabilidade do rival depende dele”. O capitalismo é débil por natureza, perecerá mais cedo ou mais tarde, a depender de nossa estratégia.


* Engenheiro agrônomo, mestre em Entomologia e doutorando em Genética. Professor do Instituto Federal do Amazonas (IFAM).

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