IMPERDÍVEL! SEMPRE O MESMO GOLPE?
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Por; Pedro Augusto Pinho
Introdução
“O subdesenvolvimento não se improvisa; é obra de séculos”
(Nelson Rodrigues, dramaturgo e jornalista – 1912-1980)
Escrevi esta série de seis artigos como
uma homenagem a Adriano Benayon, economista e diplomata recém falecido.
Também me motivou a dificuldade que estamos encontrando em equacionar
respostas ao último golpe que colocou todos os poderes definidos na
Constituição Brasileira a favor da dominação dos interesses
estrangeiros, contra a industrialização e a educação no Brasil.
É, na minha existência, a mais grave
crise conhecida. Não tenho respostas nem mesmo sugestões para o
caminhar, mas pretendo com estes escritos despertar o debate, o
contraditório, outras reflexões que contribuam para a saída deste nosso
infeliz momento.
Pedro Augusto Pinho, avô, administrador aposentado
SEMPRE O MESMO GOLPE?
Da Independência aos Primórdios da República
“Salta aos olhos a negra perfídia,
são patentes os reiterados perjúrios do Imperador, e está conhecida
nossa ilusão ou engano em adotarmos um sistema de governo defeituoso
em sua origem, e mais defeituoso em suas partes componentes.”
(Manifesto da Confederação do Equador, 1824)
Max Weber, conforme o especialista de
sua obra, Gabriel Cohn, colocava a gênese do capitalismo moderno numa
singular circunstância, única no tempo e local – o calvinismo, a
economia europeia e o surgimento de empreendedores destes resultante. O
pensador alemão estudou a economia nas demais religiões mundiais (A
Ética Econômica das Religiões Mundiais) para dar consistência àquela
ideia.
A exclusividade weberiana não parece
encontrar idêntica ocorrência em nossos golpes de estado. Ao contrário, o
Embaixador Adriano Benayon, em diversos escritos, afirmava que o golpe
ora em curso, para afastamento da Presidente Dilma Rousseff, repetia o
que levara ao suicídio o Presidente Getúlio Vargas, há mais de 60 anos, e
todas interrupções que desde então penalizaram o desenvolvimento
brasileiro.
Neste artigo pretendo levantar as bases
factuais que confirmariam o pensamento daquele homem público e
intelectual, o economista e diplomata Adriano Benayon.
Minha compreensão se funda na união de
duas forças em permanente combate à industrialização do Brasil e começa
bem antes de 1954. Refiro-me aos interesses estrangeiros e à força
política da economia rural brasileira.
A industrialização não é apenas a
economia fabril. Ela exige também a instrução das pessoas, para as
tecnologias do fazer e igualmente do usar. Impulsiona constantemente a
pesquisa e o aprofundamento científico quer para busca de novos produtos
e meios de fabricação quer para atendimento das necessidades sociais em
constante mutação.
Veja que as nações mais poderosas do
mundo são todas elas nações industrializadas. Não há qualquer país
“essencialmente agrícola” que se imponha entre os demais.
O Brasil, politicamente independente,
teve em Irineo Evangelista de Souza, Barão de Mauá (1813-1889), seu
primeiro empreendedor, que se diferenciava do empreendedor webweriano
pela religião e pelo meio onde viveu. Após viagem à Inglaterra, em 1840,
funda em Niterói uma pequena fundição, início da fortuna que contou 17
empresas, oito delas entre as 10 maiores do Brasil, atuando em seis
países, e ativos avaliados em 60 bilhões de dólares.
O colonizador da época era o Império
Britânico, que obrigaria o Brasil à guerra contra o Paraguai, que se
industrializava à revelia inglesa, e à qual Mauá se opôs. No Brasil
agrário, escravagista, Irineo pregava o abolicionismo. Ora, contrário ao
interesse estrangeiro e ao ruralismo pátrio, sofreu a oposição, até
perseguição, que o levaria à falência. Encerrava então o primeiro
movimento pela industrialização brasileira. O golpe viria no entanto
contra o próprio Império, na república sem povo (José Murilo de
Carvalho).
Nem se diga que houve sempre a
complacência ou subserviência popular. A repressão dos poderes
estrangeiros e rurais sempre foi cruel, devastadora, intensa para se
impor pelo medo aos que não aderiam pela corrupção.
Tracemos, brevemente e a título de exemplo, três revoltas que ocorreram do norte ao sul do Brasil Império.
Confederação do Equador. “A
descolonização da população pernambucana já se iniciara muito antes da
Independência ….. se tornara comum a utilização de termo “patriota”, no
tratamento entre pessoas, nos cumprimentos e referências” (A. Mendes
Jr., L. Roncari, R. Maranhão – Brasil História 2). Desde 1817, malgrado a
violenta repressão, havia um processo revolucionário, nos movimentos em
Pernambuco de 1821 (Movimento de Goiana) e 1823/1824 (Confederação do
Equador). Propunha-se um novo Estado, envolvendo todo Nordeste, numa
república inspirada nos Estados Unidos da América (EUA). Para repressão,
Pedro I contou com capitais ingleses (um milhão de libras só na
primeira parcela) e a esquadra de Lorde Thomas Cochrane. Frei Caneca,
Lázaro de Souza Fontes, Agostinho Bezerra Cavalcanti e muitos outros
foram executados. E foi dada a autorização para qualquer pessoa
assassinar os que lograram fugir.
Cabanagem. Das mais violentas lutas do
período da Regência, entre 1835/1836, envolveu índios, negros e
mestiços. Caio Prado Jr. considera “o mais notável movimento popular do
Brasil ….. as camadas mais inferiores da população conseguem ocupar o
poder de toda uma província”, a Região Norte do Brasil. A ação
repressora do Brigadeiro Soares de Andrea, com apoio de mercenários
ingleses e da força naval de Frederico Mariath realizaram verdadeiro
massacre de Belém a Manaus. Durante três anos, até 1839, foram
assassinadas 40.000 pessoas, aldeias inteiras foram incendiadas e sua
população exterminada.
Revolução Farroupilha. Talvez a mais
longa revolução brasileira. Por 10 anos ocorreram “companhias de
guerrilha” (1835-1845). O Rio Grande do Sul, longe dos centros de
decisão no Brasil, desenvolveu uma estrutura econômica e social
peculiar. Lá o trabalho escravo não teve a mesma importância e os homens
livres, não proprietários, integraram-se ao que poderia ser denominado
de projeto industrial. De certo modo, as questões farroupilhas, ainda
hoje, restam sem resposta como a nacionalização industrial, a gestão
federativa e a incorporação das classes desfavorecidas à sociedade
brasileira. O envolvimento de todas as classes sociais impediu uma
repressão igual a dos cabanos. Assim, a Revolução findou com ampla
anistia, concessão de patente de oficial a líderes revoltosos e a
libertação dos escravos que participaram das lutas.
O empreendedor Delmiro Augusto Gouveia
(1863-1917) foi assassinado pelo crime de se opor ao interesse
industrial inglês, no início do Brasil República. De sua fazenda em
Pedras (Alagoas), construiu a segunda hidrelétrica brasileira (1913) e a
fábrica de linha de costura que chegou a vender 500 mil carretéis para o
Brasil e para América Latina. Imputa-se à inglesa Machine Cotton sua
morte e a destruição da fábrica, sendo lançadas as máquinas no Rio São
Francisco.
Desde o período colonial até,
aproximadamente, a 1ª Grande Guerra (1914-1918) o interesse econômico
predominante no Brasil foi dos capitais ingleses, a partir daí capitais
dos EUA passaram a dominar. Hoje, como na profecia de Marx, é um capital
apátrida, de menos de 100 investidores, que domina não só o Brasil mas
boa parte dos países. Mas sua principal residência está nos EUA.
Quanto ao fator interno, coloco a
questão na percuciente frase do professor João Daniel Lima de Almeida
(História do Brasil, 2013) ”Na República Velha, todo o Congresso, e não
apenas uma bancada, era ruralista.” O mesmo se aplicaria ao Brasil
Império. Em todo tempo, o modelo mercantil de produção, verdadeira
“plantation”, ocupou as cadeiras dos parlamentos, os assentos
ministeriais e as cortes de justiça, estrangulando o desenvolvimento
econômico e social brasileiro.
E, assim, não foi por acaso que os
momentos onde houve, em nossa história, uma política industrial nacional
os governos eram autoritários: ditadura Vargas e militar.
SEMPRE O MESMO GOLPE?
Monteiro Lobato
“O escravo que mata seu senhor, seja em que circunstância for, age em legítima defesa”
(Luís Gama, intelectual brasileiro – 1830-1882)
O filósofo, educador, sociólogo Pierre
Bourdieu (1930-2002) concluiu, de suas pesquisas, que o filtro com que
vemos o mundo é construído ainda no início da vida e durante a primeira
infância. São a alimentação, os contatos corporais, as falas e sons, o
ir e vir dos que habitam o mesmo espaço, enfim, toda série de sensações
que impregnam a criança e que serão reforçadas na escola e na vida
social que formarão a percepção e moldarão a auto imagem do adulto. O
sentimento da inferioridade “vira-lata” poderia ter aí sua explicação.
A personalidade empreendedora e de
escritor magnífico, José Bento Renato Monteiro Lobato (1882-1948),
nacionalista que, por toda vida, lutou pela efetiva independência do
Brasil, merece uma análise específica.
Lobato não procurou apenas
industrializar mas educar, no sentido de Bourdieu, o povo brasileiro. E,
pelas ideias e arrojo empresarial, foi preso, perseguido e levado mais
de uma vez ao insucesso financeiro.
O período inicial da República em nada
se distinguia do Império. As mesmas forças governavam o País. Mas os
movimentos revoltosos passavam a se dar, também, no seio das Forças
Armadas, especialmente no Exército. A Guerra de Canudos (1896-1897) não
tinha propósitos libertários e republicanos, mas incomodou o latifúndio
nordestino, e teve a mesma selvagem resposta de todos movimentos
populares do Império.
Foi neste primeiro período republicano
que se deu a passagem dos interesses ingleses para os norteamericanos,
estes com a política agressiva do “big stick” (porrada) de Theodore
Roosevelt (1901-1909). Também a urbanização começava a introduzir novos
atores na política brasileira, em especial os de formação mais
tecnológica, onde se incluíam os militares. Tanto que os movimentos
ocorridos ao longo da década de 1920 terão a designação genérica de
tenentistas: 1922 (Levante da Marinha em abril, de Recife em maio/junho,
do Forte de Copacabana e Escola Militar em junho), 1924 (São Paulo em
julho e início da Coluna Prestes em outubro), 1925 (todo ano tomado pelo
deslocamento da Coluna Prestes que adentrará 1926) e 1930 (Revolta de
Princesa na Paraíba e início da Era Vargas).
Outro aspecto desta época é a tomada de
consciência pela intelectualidade brasileira da nossa riqueza cultural,
cujo marco é a Semana de Arte Moderna em São Paulo, mas não se limita a
ela. Temos a gravação do samba “Pelo Telefone”, a instalação, em 1923,
da Academia Brasileira de Letras no Pavilhão Francês, remanescente da
exposição do Centenário da Independência, as revistas de cartunistas (O
Malho, 1902; Careta e Fon-Fon, 1907 e D.Quixote, 1917) renovando o
jornalismo e ganha força o que será denominado “positivismo caboclo”,
propulsor de ações sociais.
Monteiro Lobato, como escritor e
empreendedor, pode ser tomado como símbolo da época. Em 1900, de acordo
com Sérgio Guerra Duarte (Por que existem analfabetos no Brasil?), os
analfabetos constituíam 65,3% da população brasileira. Celso Péricles
Fonseca Thompson, tratando da formação das Forças Armadas Brasileiras
para o conflito internacional (Participação do Brasil na II Guerra
Mundial: 70 Anos da Vitória), afirma que, em 1940, os analfabetos ainda
representavam mais da metade da população: 51,6%.
Lobato, na crônica “O Inimigo”, de
1926, ironiza a política republicana com no texto: “Como todo mundo
sabe, o livro é o causador de todas as desgraças que derrancam o homem
moderno. Antes que Gutenberg inventasse o meio de por o livro ao alcance
de toda gente, a vida do homem no mundo era edênica. O rei em cima, uma
corte em redor, plebe infinita em baixo e o carrasco de permeio”. E
acrescenta: “Essa abençoada guerra ao livro, inteligentemente surda para
que não dê na vista do espírito liberal (que é a desgraça dos povos),
intensifica-se de ano para ano, com muito bons resultados”.
Monteiro Lobato foi editor que lançou
diversos brasileiros jovens no mundo das letras. E, como ocorreu com
muitos na época, se deixou encantar pelo crescimento dos EUA, pela
industrialização e administração americana. Traduziu “Os Princípios da
Prosperidade”, do magnata Henry Ford, mas, aos poucos, foi compreendendo
o vêzo imperialista dos EUA e sua obra foi tomando outra direção. Em
1936, seu livro “O Escândalo do Petróleo” foi proibido logo após o
lançamento e só voltou às livrarias em 1945.
Mas Lobato não era o comunista que a
Igreja e muitos oportunistas afirmam. Mas o comunismo e a corrupção já
eram usados como adjetivo a todos que se insurgiam contra a aliança
ruralista-entreguista do poder no Brasil. E Lobato tocava fundo nos
donos do poder em sua luta contra a política de manutenção de um povo
analfabeto, ignorante e temeroso aos poderosos. Estes cínicos, com
discursos que combatiam suas práticas, sonegavam a educação e a saúde da
população em geral e, em especial, da parcela mais desfavorecida, com
total afinco.
Podemos dizer que por toda República
Velha, como no Império, houve um permanente golpe contra o povo
brasileiro, praticado pelos poderosos.
Monteiro Lobato, como fazendeiro no
interior paulista, não se satisfaz apenas com a modernização agrícola e
pecuária que desenvolve, usa o lucro da fazenda para abrir um
educandário em Taubaté. E por toda a vida será empreendedor e escritor,
denunciando as mazelas, que afligem ainda hoje nosso povo, e os
governantes alienados, golpistas ou incapazes que nos impõem o
ruralismo, a ignorância e os interesses estrangeiros.
Cabe ainda, sob a égide lobatiana,uma
consideração do golpe permanente que se dá com o processo educacional.
Muitas vezes na imprensa, nos discursos parlamentares e oficiais é
apresentada a denúncia sobre nossa educação, falha ou ausente. Mas não é
o próprio poder que assim a coloca? Não é esta uma função do Estado?
Desde a Constituição de 1884, a instrução de todos os cidadãos está
assegurada pelos poderes públicos. Apenas na Constituição de 1967
aparece seu fortalecimento pelo ensino privado. E na de 1988 em vigor,
nas palavras da professora Maria Cristina Teixeira (O Direito à Educação
nas Constituições Brasileiras, 2008) “a mais pródiga no que diz
respeito ao reconhecimento de direitos fundamentais e garantias para seu
exercício”, está inserida nos Direitos Sociais (art. 6º) e tratada em
Seção específica do Capítulo III, ao longo de 10 artigos.
E o mais recente golpe tratou de
minimizá-la unindo educação e cultura, sempre insistindo no corte de
verbas e alterando a composição do Conselho Nacional de Educação, com
evidente propósito de, mais uma vez, subordinar a educação aos
interesses ruralistas, financistas e estrangeiros.
SEMPRE O MESMO GOLPE?
De Vargas a Jango
As nações do mundo para cá mandaram
Os seus capitais desinteressados
As nações, coitadas, queriam ajudar
(Canção do Subdesenvolvido, Carlos Lyra e Chico de Assis)
Devo deixar bem claro que jamais serei e
nunca fui defensor da opressão e do arbítrio. Ferem-me profundamente as
injustiças sociais e o cerceamento das liberdades por questões de
opinião. Sabotar a educação, como se verificou em quase toda nossa
história, é cercear a liberdade, como o fazem aos jornalistas os donos
da “grande” imprensa; as cinco famílias que controlam a comunicação de
massa no Brasil..
Getúlio Dorneles Vargas (1882-1954) foi
um ditador e, nesta condição, pode superar algumas pressões contra a
industrialização do Brasil. Sua personalidade, ainda hoje, é polêmica,
mas é também indubitável que seu nome seja sempre lembrado pelas camadas
mais pobres e oprimidas da população como “o grande Presidente”, pela
inscrição dos direitos trabalhistas e sociais na legislação brasileira.
Não surpreende portanto que, volta e meia, o golpista de plantão fale em extinguir a Era Vargas.
O projeto tenentista, que seria
vitorioso na Revolução de 1930, defendia o “industrialismo” e o
estabelecimento “em todo o país do ensino primário e da instrução
profissional e técnica gratuitos”. Mas, como escrevem Antonio Mendes Jr e
Ricardo Maranhão (História do Brasil 4), “a grande ironia da história
seria que …. quando os tenentes chegaram ao poder ….. o tenentismo
deixou de existir”.
Pode-se dizer que a oligarquia rural
dos Accioly, Horácio de Matos, Chico Heráclito, Theodorico Bezerra vai
sendo substituída pela dos Távora, Juracy Magalhães e outros impostos
pelo “Vice-Rei do Norte”. Era a ditadura de coalizão ou das prisões.
Mas é para mim indiscutível que, no
próprio interesse profissional de armamento e munições, as Forças
Armadas foram incentivadoras e garantidoras do avanço da
industrialização nacional.
O sucesso da Revolução de 1917 na
antiga Rússia Tsarista e a fundação do Partido Comunista do Brasil,
depois renomeado Brasileiro (PCB), em março de 1922, trouxe a “questão
social” para o processo da industrialização.
Recordemos que o Brasil Agrário sofrera
intensamente com a crise do capitalismo de 1929. Faltava capital, além
da vontade política, para a ênfase na industrialização. Em 1942, com a
motivação da guerra, Franklin D. Roosevelt enviou “missão técnica” para
intensificar a produção bélica no Brasil. O chefe desta missão, Moris L.
Cooke, avaliou que ser nosso “estágio primitivo de desenvolvimento
industrial”, pois tínhamos uma “simples transformadora de
matérias-primas agrícolas”.
Efetivamente, as indústrias brasileiras
eram quase unicamente têxteis e de couro e “pequenas demais”. Ao lado
disso, os empresários mais se preocupavam com o sindicalismo e a
ideologia comunista do que com o mercado e a modernização. O ícone da
industrialização, Roberto Simonsen, em 1918, discursava aos operários
sobre a gripe espanhola, dizendo que deveriam ser evitadas, além da
doença, “as lutas de classe, as organizações artificiais, os entraves à
verdadeira noção de liberdade”. E, de fato, o verdadeiro órgão de
recrutamento e seleção das empresas paulistas não estava na estrutura da
empresa mas nas delegacias regionais de polícia. O Centro dos
Industriais de Fiação e Tecelagem de São Paulo (CIFTSP) assume, com a
colaboração policial, a “identificação científica de todos os operários
das fábricas que lhe são filiadas”. Antes da carteira de trabalho, o
trabalhador teve a ficha policial.
O golpe de 29 de outubro de 1945 deu-se
na sequência da luta da democracia contra o fascismo, mas na estratégia
de dominação dos EUA. Tanto que o apoio do Embaixador Adolfo Berle foi
fundamental para o convencimento das principais lideranças militares. E
este, como todos os demais, não se deu apenas contra um governante mas
contra as forças populares que se organizavam.
Getúlio Vargas será deposto duas vezes, sendo a segunda por seu suicídio.
Carece uma consideração sobre a classe
média que já se torna significativa com a urbanização brasileira. De
modo geral eram os diplomados, médios e superiores, oriundos das velhas
estruturas agrárias, que passavam a ocupar, na área militar e na área
civil, os cargos de maior exigência técnica. Estes constituiriam a
burocracia que reafirmava os poderes vigentes. Assim, quer nas
atividades do executivo como nas do judiciário se formava um círculo de
proteção aos interesses rurais e estrangeiros, estes pela característica
do modelo da “plantation”. Esta classe média, sempre desinformada pela
comunicação de massa, será utilizada para os golpes contra o país. Não
se esqueça que, antes mesmo do fim da II Grande Guerra, Nelson
Rockefeller já orientava o governo norteamericano para a propaganda,
necessária para o domínio dos EUA no exterior, o que Hollywood faria com
extraordinária competência e sucesso.
Assumindo Café Filho, em 1954, a
Presidência nomeia Eugênio Gudin para Ministro da Fazenda. Um verdadeiro
golpe contra o Brasil e a industrialização como se vê na frase relatada
pelo General Edmundo de Macedo Soares que ouviu de Eugênio Gudin: “o
Brasil não deve possuir indústrias pesadas …….. siderurgia é para povo
branco.”
Dos golpes daquela época há também
contra a criação da Petrobrás. O atual Vice-Governador Francisco
Dornelles narra que seu pai, General Mozart Dornelles, era Subchefe do
Gabinete Militar de Getúlio Vargas, em 1954. O maior empresário da
midia, dono dos dois únicos canais de televisão no Brasil, era Assis
Chateaubriand. Ele colocou seus canais de TV à disposição de Carlos
Lacerda que toda noite perorava agressões a Getúlio e pedia sua
renúncia. General Mozart procurou Chatô, usando seu bom relacionamento
com o empresário, sem que Vargas soubesse, e perguntou qual a razão de
tanta crueldade. Chateaubriand não dissimulou suas razões: “Mozart, eu
adoro o Presidente. Basta ele desistir da Petrobrás e eu tiro o Carlos
Lacerda e entrego a televisão a quem o Presidente quiser, para fazer a
defesa do governo”. Chocado, o General foi a Tancredo Neves, seu cunhado
e naquele tempo Ministro da Justiça, a quem relatou o episódio.
Inconformada com a eleição de Juscelino
Kubitschek de Oliveira (JK), a União Democrática Nacional (UDN),
partido derrotado na eleição, articula golpe contra sua posse e
posteriormente parcela da Força Aérea tenta por duas vezes, Jacareacanga
e Aragarças, em 1956 e 1959, aplicar outro golpe. Mas JK anistiou os
militares e, como faria anos depois Luiz Inácio Lula da Silva, procurou
conciliar os interesses nacionais com os poderosos de sempre. A saída de
José Maria Alckimin, Ministro da Fazenda que sustentou uma política
desenvolvimentista embora inflacionária, e a nomeação de Lucas Lopes,
com uma política monetarista, ainda que obrigado a romper com o Fundo
Monetário Internacional (FMI), pode ser um exemplo. Outro seria manter
intacta a estrutura agrária mesmo criando, em 1959, a Superintendência
de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), para a industrialização
regional.
Há fundamental diferença entre a
industrialização de Vargas e de Kubitschek. A primeira usou recursos
públicos para empresas públicas e de propriedade de brasileiros, a de JK
usou os recursos públicos para empresas estrangeiras e privadas
nacionais. A cessação de eventuais incentivos à Fábrica Nacional de
Motores (FNM) e os recursos e privilégios às automobilísticas
estrangeiras é uma evidência.
Um golpe que deu errado viria com a eleição de Jânio Quadros. A ambiguidade
de ser, ao mesmo tempo, o candidato dos
mais ricos e dos mais pobres, adotar uma política externa independente
de Washington, com uma economia ditada pelo FMI, um comportamento mais
para Prefeito do que para Presidente levou-o a tentar um golpe, certo de
que o poder o preferia à Jango e os eleitores o confirmariam. Leoncio
Basbaum (História Sincera da República) entende que o povo “votou apenas
contra”. Contra o alto custo de vida e o desenvolvimento unilateral de
JK que não cogitou do povo (saúde e educação). Mas gerou tal queda de
expectativas e perplexidades que possibilitou a posse de João Belchior
Marques Goulart (Jango), uma derrota dos golpistas que muito se deveu à
liderança de Leonel Brizola (Rio Grande do Sul) e de Mauro Borges
(Goiás).
SEMPRE O MESMO GOLPE?
Os Militares no Planalto
Que ligação existe entre sociedades
geográfica, histórica e culturalmente distantes, do Kosovo à Líbia e à
Síria, do Iraque ao Afeganistão, da Ucrânia ao Brasil e à Venezuela? O
traço comum é serem sociedades arrastadas à estratégia global dos
Estados Unidos, exemplificada pela geografia do Pentágono.
(Manlio Dinucci, Estratégia do Golpe Global, 2016)
A participação dos Estados Unidos da
América (EUA) no golpe de 1964 já está nos livros escolares, em obras de
historiadores e jornalistas e no cinema, onde destaco o documentário “O
Dia Que Durou 21 Anos” de Camilo Tavares, lançado em 2013. Lembrarei
somente a presença do Padre Patrick Peyton, agente da CIA, financiado
por centenas de empresas multinacionais, que no Brasil organizou a
Marcha da Família com Deus pela Liberdade, preparando o psicossocial das
classes médias católicas para o golpe.
Na minha percepção, o Governo Jango
teve mais discursos e projetos do que efetivas ações. Faço a ressalva, o
que por si só já colocava os golpistas em pânico, do Plano Nacional de
Alfabetização de Adultos, iniciado pelo pedagogo Paulo Freire, em 1962,
que formulou um método de alfabetização fundada na realidade existencial
do aluno, primeiro implantado em Pernambuco, e logo se espalharia no
Nordeste e em todo País, com a acolhida pelo Ministério da Educação e
Cultura, nas gestões de Paulo de Tarso e Júlio Sambaqui.
A face estrangeira dos golpes sempre
dedicou especial olhar para a política cambial. Ainda hoje, mesmo com o
domínio do Congresso, as forças golpistas afastam do debate mais amplo a
questão do câmbio, deixando nas “mãos profissionais” as decisões. Antes
da criação do Banco Central, em 31 de dezembro de 1964, a competência
sobre o câmbio era da Superintendência da Moeda e do Crédito (SUMOC),
desde sua criação em 1945, que emitia as Instruções. Pela Instrução nº
70, de 1953, estabeleceu-se o câmbio múltiplo, definindo as diferentes
taxas conforme a essencialidade dos bens. De um lado esta Instrução
protegia a indústria brasileira e, de outro, buscava recursos
financeiros para o Estado. Café Filho e seu Ministro Gudin, logo após o
golpe, em janeiro de 1955, baixaram a Instrução nº 113, que permitia a
importação sem cobertura cambial e eliminava um “obstáculo” à livre
“entrada de capitais”. É evidente o prejuízo para indústria brasileira e
esta Instrução foi uma ferramenta da industrialização por
multinacionais no Governo JK.
No curto Governo Jânio Quadros, em
março de 1961, a dupla Clemente Mariani(Ministro)/Gouveia de
Bulhões(SUMOC) emite a Instrução nº 204 que revoga as taxas múltiplas e
deprecia em 100% a moeda brasileira, a pretexto de melhorar as
exportações.
O Governo Castello Branco iria mais
longe ao baixar a Portaria nº 184, em junho de 1966, que isentava do
Imposto de Renda as empresas estrangeiras de planejamento e projeto de
engenharia e mesmo quando prestadoras de serviço em consórcio no Brasil e
fixava a margem de 20% para seus agentes ou representantes.
Mas a reação nacional se deu com um
novo golpe que levou o Marechal Artur da Costa e Silva à Presidência, em
março de 1967. Com ele, empresários e militares avessos ao
“internacionalismo” da Escola Superior de Guerra (ESG), com forte apoio
das associações de engenheiros propensos à defesa da indústria nacional,
passaram a dar novo rumo à economia.
No meu entender é preciso distinguir
aquela política econômica da política social e da ideologia então
reinante. Todos os participantes tinham convicção anticomunista e pouca,
se alguma, preocupação social. Defendiam seus negócios e seus empregos,
mas, com isso, desenvolviam a economia em bases nacionalistas. Um
detalhado e bem documentado estudo sobre esta época e estas relações
está no rigoroso trabalho do historiador Pedro Henrique Pedreira Campos,
da UFRJ, “Estranhas Catedrais”, de 2014.
Li, já nem sei onde nem mesmo qual
idioma, a irônica crítica que afirmava ter sido um problema dos EUA, na
II Grande Guerra, convencer seus oficiais que os inimigos eram os
fascistas e os nazistas. A união do anticomunismo com o nacionalismo
permitiu que desde Costa e Silva até Ernesto Geisel o recurso público,
como na Era Vargas, financiasse a empresa estatal e a empresa sob
controle brasileiro. Emílio Garrastazu Médici (outubro de 1969 a março
de 1974) aproveitou aquele momento que o capitalismo industrial estava
enfraquecido pelas ações do capitalismo financeiro. Para mim a criação
do Clube de Roma, em 1968, e a publicação de “Os limites do crescimento”
(1972) são icônicos desta luta. Este fato influiu para consecução do
“Milagre Brasileiro”, de Delfim Netto, Ministro da Fazenda de 1967 a
1974, que pode implementar com sucesso a política de substituição das
importações.
O capitalismo passava para as mãos
financeiras, como havia ocorrido, na segunda década do século XX, quando
saiu dos interesses ingleses para os norteamericanos. Portanto as novas
crises seriam provocadas pelo mecanismo de concentração de renda e
transferência de receitas de todos os segmentos econômicos para o
financeiro.
Esta grande mudança ou não foi bem
percebida pelo Presidente Ernesto Geisel (1974 a março de 1979) ou os
castellistas (Golberi, Simonsen), que com ele tomaram o poder, influíram
para o crescente endividamento. Pois Geisel continuava executando os
Planos de Desenvolvimento, definidos pelos governos desde Costa e Silva,
que exigiam, entre outros gastos, a importação de petróleo e
investimentos na Petrobrás, gerando a dívida buscada pelo sistema
financeiro internacional, a banca como o denomino.
A este respeito o historiador inglês E.
P. Thompson, em obra com G. Garrett (Ascensão e Dominação da Índia pelo
Império Britânico, 1934) tem inolvidável passagem: “não importa se o
camponês que toma empréstimo o faz alegremente ou de má vontade: o
resultado é sempre o mesmo, ele deixou de ser um homem livre”.
Segue-se, portanto, a pressão contra os
governos militares, tendo a banca como financiadora. Não foi um
movimento unicamente brasileiro, era a nova estratégia de trocar a farda
pela toga em toda América Latina e empoderar o legislativo, refém dos
“financiamentos de campanha”.
A passagem se dá no fraco Governo
Figueiredo, quando se iniciam as propagandas de desconstrução do Estado e
pelas privatizações. Sofreriam novamente a indústria nacional e a
educação ficava no tradicional desamparo.
O mais curioso é que não foi o
comunismo mas o capitalismo, em sua nova fase, financista, que levou ao
fim o ciclo militar, importante desde o Império.
SEMPRE O MESMO GOLPE?
Da Constituição de 1988 a Lula
“Está no caixão, exposto
como uma mercadoria;
à mostra, para vender,
quem antes tudo vendia”
(Velório de um Comendador,
João Cabral de Melo Neto)
José Sarney (1985-1990) presidente pelo
acaso, sem apoio nem credibilidade política, afinal pertencera ao
partido de sustentação dos governos militares, para se manter no cargo
aceitou todo tipo de pressão que as mais poderosas forças econômicas,
políticas e classistas lhe fizeram ao longo de seu período. Assim, a
elevada inflação, o desmonte do Estado, a inércia da burocracia
colocaram todos os candidatos à sua sucessão em oposição ao Governo.
Deu-se então um verdadeiro golpe midiático, com o protagonismo do
sistema Globo de comunicação, que levou Fernando Collor, sem qualquer
base política consistente, à Presidência.
O mais relevante fato deste período foi
a Constituição promulgada em 1988. O ambiente da época, oposto aos
militares e já sob domínio do capital financeiro, a banca, entre avanços
sociais e até econômicos, colocou algumas armadilhas nesta Carta Magna:
o domínio do Poder Judiciário, com reforço do Ministério Público, a
ausência de dispositivos protetores da segurança institucional e a
facilidade de emendar a Constituição. Esta última, por exemplo,
permitiu retirar os avanços da definição de empresa brasileira, da
limitação de taxas de juros e da execução do monopólio estatal do
petróleo pela Petrobrás. Todas emendas ocorridas no período de governo
absoluto da banca, o tucanato de Fernando Henrique Cardoso.
A construção e consolidação de empresas
nacionais, estatais e privadas, fortes e capazes de competitivamente
concorrerem no exterior, que os governos militares ao longo de 15 anos
haviam conseguido obter, foi sendo paulatinamente desfeita pelas
privatizações e pelos orçamentos governamentais. Esta desconstrução já
se iniciara com o Governo do General Figueiredo, principalmente na
estratégica área da informática, e prossegue até hoje com o golpe do
impedimento. Setores vitais para a soberania, como das comunicações, da
área nuclear, do domínio técnico-científico das atividades
aeroespaciais, do controle da exploração do subsolo brasileiro, além da
já referida informática, vão sendo transferidos para o domínio
estrangeiro ou sendo desmobilizados pela falta de recursos
orçamentários, unicamente voltados para o pagamento dos altos juros das
dívidas, ou seja, para as transferências de ganhos para a banca.
A novidade deste período foi a eleição e
o Governo Lula, por oito anos. Fenômeno que tomou dimensão
internacional; um operário chegar e se manter na presidência de uma das
maiores economias mundiais, pelo voto popular. E ter sabido, de algum
modo, controlar a ânsia golpista da banca e do ruralismo, promovendo
importante transformação social e dando ênfase à educação.
Em seus mandatos o Brasil passou a
contar com mais Universidades Federais e Escolas Técnicas Federais do
que todos os governos anteriores haviam constituído. Questiona-se a
qualidade do ensino, como se pudesse ser obtido por vara de condão. O
ensino, como está nos escritos e trabalhos dos grandes mestres
brasileiros, Fernando de Azevedo, Anísio Teixeira, Paulo Freire e nos
contemporâneos estrangeiros, como Pierre Bourdieu, é um processo de
gerações, onde o mais importante é a continuidade e o desenvolvimento.
As tentativas de golpe, nesta nova fase, foram do Congresso e do Judiciário, sendo o “Mensalão do PT” a mais marcante.
Devo também deixar claro minha postura
inteiramente contrária à prática e à proteção da corrupção, seja ela do
setor público quanto do privado.
Mas não podemos ingenuamente e como
pregam ideologicamente os que se denominam liberais entender que apenas
no Estado se dá a corrupção. Os exemplos da corrupção privada são
constantes, em todo mundo, e muito mais numerosos e profundos do que a
comunicação de massa propala. Procura-se estabelecer um confronto entre
Estado e Mercado, as duas instituições do capitalismo moderno, como se
numa estivesse todo erro e noutra toda virtude. É o que pregaram os mais
reconhecidos defensores dos interesses estrangeiros no Brasil, como
Eugênio Gudin e Roberto de Oliveira Campos.
Mas é preciso separar o que representa o
combate á corrupção do que é o golpe judiciário ao desenvolvimento
industrial do Brasil.
Dou apenas um exemplo de corrupção que
não é assim considerado pois beneficia pura e absolutamente o sistema
financeiro e a especulação. Em 1999, durante o período FHC, sendo
Ministro da Fazenda Pedro Malan e Presidente do Banco Central Armínio
Fraga, a inflação, medida pelo IPCA, foi 8,94% no ano. As taxas SELIC
definidas nas reuniões do Comitê de Política Monetária (COPOM), em 04 de
março e 06 de outubro, foram, respectivamente, 44,95% a.a. e 18,87%
a.a.. Em 03/março/1999, a taxa cambial foi US$ 1/R$ 2,16, e a partir de
abril oscilou em torno de R$ 1,80. Veja que enorme perda teve o Brasil
com esta conjugação do câmbio com o juro. Se isto não é corrupção é
indício de uma ignorância que estes senhores nunca demonstraram ter.
Fatos como este ficam escondidos da população, mas um faturamento
duvidoso de um milhão de reais é amplamente divulgado se, com isso,
atingir um interesse nacional, como o desenvolvimento nuclear, ou uma
empresa estratégica para nossa soberania.
SEMPRE O MESMO GOLPE?
A Primeira Mulher Presidente
“Quanto custa conciliar paixões
opostas, vencer obstinados e preocupados, instruir ignorantes,
desmascarar hipócritas, ameigar altanados e escapar aos golpes da
intriga e das cabala.
(José Bonifácio de Andrada e Silva, Patriarca da Independência)
As eleições da primeira mulher a ocupar
a Presidência do Brasil foram recebidas pelos golpistas como duas
derrotas, sendo a segunda a mais dolorosa pelo enorme investimento feito
no candidato oposicionista.
Mas não foi neste momento que se estruturou o modelo que resultaria no golpe do impedimento da Dilma Rousseff.
As informações que me orientaram nas
reflexões que faço a seguir foram obtidas em sites oficiais do Governo
dos Estados Unidos da América (EUA) e nas denúncias públicas do
WikiLeaks.
O modelo que envolve a academia, a
empresa e o governo para a ação geoestratégica de uma ideologia ou, mais
oportunisticamente, de um setor econômico, nem é novidade no
capitalismo nem o foi no comunismo, mas se aperfeiçoa no tempo e na
qualificação dos agentes. Por brevidade exemplifico com as realizações
de Goebbels, na Alemanha, as orientações de Lênin e, aqui no Brasil, nas
edições da Fundação Getúlio Vargas de obras patrocinadas pela Aliança
pelo Progresso, nem só publicitárias como de formação acadêmica em
administração. O papel da Escola das Américas (School of Americas)
quando a ênfase golpista era a formação dos militares é pública e
notória.
Hoje, malgrado as diferenças do direito
dos povos latinos, com base no Direito Romano, do direito inglês e
norteamericano, consuetudinário, o modelo de dominação colonial ignora
estas origens na pragmática prática da aplicação da justiça para a
aplicação dos golpes e o imobilismo e retração econômica.
O juíz Sérgio Moro é um fruto desta
mudança de procedimento. A base e pretexto está no combate aos crimes
financeiros e ao terrorismo.
Documento divulgado pelo WikiLeaks, a
respeito do “sucesso” da Conferência no Rio de Janeiro, entre 4 e 9 de
outubro de 2009, da qual participou o juíz Moro, diz da demonstração de
“como preparar uma testemunha a depor” e que nos futuros encontros
deverão ser tratadas a formação de forças-tarefa e as finanças
ilícitas. O documento trata ainda da participação de juízes, promotores e
policiais do México, Costa Rica, Panamá, Argentina, Uruguai e Paraguai.
Relata o “pedido” dos participantes sobre “a recolha de provas,
interrogatórios e entrevistas, habilidades na sala dos tribunais, modelo
de força-tarefa”. O Projeto Pontes, como denomina o documento, mostra a
efetiva infiltração estrangeira no preparo da justiça do Brasil e
outros países para o golpe.
Assim, a incriminação da ex-Presidente
da Argentina Cristina Kirchner por corrupção, que noticia a imprensa, no
mínimo gera desconfiança.
Podemos então acreditar que a Operação
Lava-Jato é fruto deste novo modelo, pois ao tempo que prepara um golpe,
desestrutura toda área de engenharia de construção e montagem, que já
atuava com êxito no exterior, e avança nas áreas estratégicas da
energia, em especial a nuclear e de petróleo.
Cabe tratar agora da comunicação de
massa no Brasil. No afã anticomunista, os governos militares acabaram
por criar um modelo monopolista de comunicação de massa, centrado nas
empresas do Sistema Globo. Este modelo é perverso não só nas divulgações
parciais, deturpadas e de caráter doutrinador, como na formação de uma
consciência derrotista e irada, numa prática voltada a um “habitus”
bourdiano de abulia e indefinida revolta. Um verdadeiro crime contra a
cidadania.
Nenhum governo após 1985, por
oportunismo, medo ou incompetência conseguiu reverter esta situação
danosa para a construção do País e para existência do Brasil soberano.
O governo ilegítimo que se apossou com o
golpe não teve pudor ao atacar com ímpeto as significativas, ainda que
poucas, conquistas em prol da soberania popular, como a Bolsa Família, o
Mais Médico e Minha Casa Minha Vida. O que dirá então da
industrialização e da educação.
O mundo está passando por crise enorme
resultante das mais de três décadas de domínio do sistema financeiro
internacional (a banca). Como não é de estranhar, a imprensa pouco ou
nada divulga sobre as ocorrências que não sejam as europeias e
norteamericana e sob a ótica estreita de seus interesses. Para os que
não tem acesso a publicações estrangeiras informo dois sites: Pátria
Latina e Dinâmica Global que, com as páginas semanais da editoria
internacional do Monitor Mercantil, permitem avaliar os cenários
internacionais. Estes, a meu ver, não descartam uma possível guerra. Ela
já ocorre no Oriente Médio, na África e na Ásia. Não me surpreenderia
sua chegada à Europa.
Por outro lado os BRICS constituem a
única efetiva oposição à banca e o provisório Ministro José Serra já
mostra a que veio atacando esta instituição cujo fortalecimento pode ser
a única saída pacífica da crise deste financismo. Mas seria esperar
demais de um governo de tão frágeis competências e tão profundos
compromissos.
O processo para transformação dessa
realidade será necessariamente revolucionário, o que não significa
sangrento, começando pela profunda análise das instituições típicas do
capitalismo moderno e seus espaços e atuações no Brasil. Estado e
Mercado se completam numa sociedade livre, democrática e plural.
O Brasil nem é a Belíndia, nem há dois
ou três Brasil, como se procura difundir, inclusive em teses acadêmicas.
O Brasil é igual a qualquer sociedade onde convivem níveis de renda e
sociais, identidades étnicas e culturais, crenças religiosas e ateísmo,
mas que todos devam ter efetivamente os mesmos direitos e benefícios da
cidadania, que as minorias disponham de voz, que ninguém seja obrigado à
vassalagem para sobreviver. O atual governo, nestes aspectos, é um
mergulho nas trevas, mais profundo dos antinacionais que já tivemos.
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